Filme do dia (47/2024) – “Adoradores do Diabo”, de John Schlesinger, 1987 – Após perder a esposa em um terrível incidente, o psicólogo Cal Jamison (Martin Sheen) muda-se para Nova York com seu filho Chris (Harley Cross), tentando esquecer todo o sofrimento que ambos vivenciaram. Trabalhando como terapeuta para o departamento de polícia, Cal toma conhecimento de um terrível assassinato ocorrido na cidade com indícios de seita religiosa. Mas o descrente Cal não acredita no poder do mal...
Mesclando os gêneros policial e terror, o filme apresenta dois aspectos principais – se por um lado acerta no uso do terror psicológico e resulta numa obra com ritmo e tensão marcantes, por outro é um dos filmes que eu já vi mais perniciosos para os praticantes de religiões de matriz africana. Mas vamos por partes. A obra apoia-se em uma leitura superficial e bem equivocada da mistura de religiões africanas e católicas, que, nos países de língua espanhola, é conhecida como “santeria”. É fato que, em algumas religiões de matriz africana é comum o sacrifício de animais – o que certamente é sofrível – mas daí para o sacrifício humano há léguas de distância. O filme faz um imbróglio bem bizarro em relação a essas religiões, joga tudo no mesmo saco – como se todas as crenças de origem africana fossem marcadas por sacrifícios e mortes – e pesa a mão ao retratar os rituais, sempre regados a sangue. Para piorar, o título em português – que não podia ser mais errado – relaciona tudo à entidade maléfica do “diabo”, que sequer existe nas religiões de matriz africana, pois intrinsicamente relacionada às crenças cristãs. Não consigo não ver um preconceito horrível, marcadamente racista, nessa leitura das religiões africanas, o que é bem difícil de aceitar para mim. Assim, para aproveitar um pouco melhor a obra, precisei superar certo ranço que ela me causou – e que talvez cause em outros espectadores. Superando essa questão, tenho que confessar que o filme funciona no que se refere a envolver o espectador num clima de temor do desconhecido – e, para mim, filme de terror que vale são sempre os que tratam do sobrenatural, caso deste aqui. Além do elemento sobrenatural funcionar, há o thriller policial, que também é bem construído – achei a transição de um gênero para o outro bem gradativa, o que me gradou bastante. E, como cereja do bolo, temos a cena final que é quase um plot twist, criando um desfecho angustiante e perfeito. Não vou me ater a questões formais – o filme é todo bem-feito, não cai na trasheira oitentista tão comum, mas também não traz qualquer inovação em questão de linguagem cinematográfica, é tudo bem convencional. Acho que destaque merece o elenco, marcadamente pela presença de um ator do calibre de Martin Sheen, que, como era de se esperar, interpreta com seriedade o protagonista Cal – o personagem tem peso, lida com a contradição entre a descrença esperada de um profissional da ciência e o medo de um desconhecido que se descortina na sua frente; o ator mirim Harley Cross não decepciona e tem boas cenas ao longa da obra como o filho Chris. Helen Shaver, que interpreta a namorada Jessica, também está bem, em especial na cena do rosto. No elenco, ainda, Robert Loggia, Harris Yulis, Richard Masur e Malick Bowens. Olha... é um filme de terror oitentista acima da média – tem, como eu disse, problemas, mas tem o “climão” que se espera do gênero. Eu gostei – não ameeeeei, mas gostei. Aparentemente existe para ver em streaming no Amazon Prime com o título “Os Crentes” ( The Believers), segundo o Justwatch.
Commenti