Filme do dia (17/2025) – “O Carteiro e o Poeta”, de Michael Radford, 1994. Década de 50, Itália. Por questões políticas, o poeta chileno Pablo Neruda (Philippe Noiret) exila-se em uma minúscula ilha italiana. Ali ele conhece Mario Ruoppolo (Massimo Troisi), um carteiro contratado exclusivamente para levar-lhe sua abundante correspondência, e vê nascer uma profunda amizade.

Inspirado livremente no livro “Ardiente Paciencia” (1985), de Antonio Skármeta, o filme transfere local – do Chile para a Itália - e momento histórico da trama- anos 70 para década de 50 -, retirando-lhe o (importante) teor político, mas mantendo seu caráter profundamente poético. Na obra cinematográfica, o simplório Mario é contratado para ser o carteiro exclusivo do poeta Pablo Neruda, exilado em uma pequena e carente ilha italiana. O vilarejo de pescadores entra em polvorosa pela presença do estrangeiro famoso, mas o poeta mantém-se recluso em sua casinha afastada. Mario, em sua simplicidade, demonstra curiosidade pelo escritor e por sua arte, despertando simpatia de Neruda, que passa a lhe dispensar atenção e ensinamentos que ultrapassam a mera escrita, alcançando a totalidade da vida. Quando Mario apaixona-se pela bela Beatrice, o carteiro recorre aos poemas de Neruda para conquistá-la. Discorrendo sobre amizade, amor, inspiração e processo criativo, a obra vai muito além, pois abraça a missão de falar sobre a poesia da vida e de como é possível se extrair beleza das coisas mais comezinhas. Neruda, na narrativa, é um homem profundamente engajado, seja nas questões políticas - um comunista convicto -, seja nas artísticas – ele, pacientemente, mostra ao carteiro um outro olhar sobre a vida, ensinando-o a reconhecer pequenas poesias do cotidiano e a beleza contida nas teimosas ondas do mar ou nas “tristes” redes dos pescadores. Em contrapartida, o poeta recebe, de seu simplório amigo, uma dedicação incomum e a admiração infinita para toda uma vida. A narrativa é linear, muito embora com elipses de tempo, em um ritmo lento e suave, que acompanha a vida calma e pacata do vilarejo. A atmosfera é leve e poética desde seus primeiros minutos, mas é nos ensinamentos e no olhar de Neruda que essa poesia se intensifica. É destes filmes que encantam pela delicadeza das imagens e interações apresentadas, o que é intensificado pela lindíssima trilha sonora e pela fotografia colorida que explora muito bem a beleza cênica local. Mas é na dupla de intérpretes central que o filme chega em seu auge: Philippe Noiret cede simpatia e condescendência ímpares ao personagem Pablo Neruda – sua paciência infinita com a simplicidade de Mario é tocante, e percebemos o quanto o poeta vê vida e beleza em seu estado mais bruto no novo amigo; já Massimo Troisi impõe tal ingenuidade no personagem Mario que desde o início temos vontade de acolhê-lo. Mario mostra-se aberto e sedento por ensinamentos e desenvolve uma admiração legítima pelo escritor, muito além daquela surgida de um leitor voraz – chega a ser uma devoção, uma inabalável devoção. Completando o elenco, Maria Grazia Cucinotta como Beatrice e Linda Moretti como Dona Rosa. O filme foi indicado para inúmeras categorias nos principais prêmios e festivais cinematográficos – Oscar (1996), BAFTA (1996), César (1997) e Critics’ Choice Awards (1996), dentre outros -, sendo agraciado com o Oscar de Melhor Trilha Sonora, BAFTA de Melhor Filme Estrangeiro, Melhor Direção e Melhor Trilha Sonora e Melhor Filme Estrangeiro no Critics’ Choice Awards. É um filme lindinho, muito bonito mesmo. Gosto demais e recomendo. Disponível em streaming no Belas Artes A La Carte e no Prime Video.
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