Filme do dia (135/2024) – “O Que Queríamos Ser”, de Alejandro Agresti, 2024 – Um homem e uma mulher se conhecem após uma sessão de cinema e se sentam para beber alguma coisa. Eles não se conhecem e a mulher sugere um jogo – que eles sejam o que eles quisessem ser, criando um espaço onde as expectativas sociais ou os ensejos da vida não pudessem interferir. Durante anos, eles se encontram, habitando esse mundo mágico que eles criaram apenas para eles.
E se pudéssemos ser o que quiséssemos, sem qualquer interferência externa? Se não existissem pressões sociais, expectativas familiares, obstáculos logísticos ou financeiros ou até mesmo históricos para a realização de nossos sonhos? Este filme brinca com essa ideia de sonhos não realizados – não deu... mas, e se tivesse dado, como teria sido? Um casal se conhece e, seguindo uma proposta da mulher envolvida, não oferecem informações reais sobre si próprios, mas, sim, sobre quem teriam sido caso a vida não os tivesse impedido de seguir seus sonhos. Assim, Yuri e Irene – nomes também criados por eles – se encontram no mesmo bar durante anos, construindo uma história e um universo só seu. Eles se apaixonam, mas jamais se tocam – o mundo mágico que criaram e no qual podem dividir as maiores intimidades de seus “alter ego” é mais importante e qualquer movimento em falso poderia destruir essa realidade paralela e os sonhos nela contidos. Assim, se o filme discorre sobre os sonhos e possibilidades que nos são tirados pela vida cotidiana, ela também trata do amor não realizado fisicamente, muito embora pungente no plano emocional. A narrativa é linear, em ritmo moderado – os acontecimentos se passam quase integralmente dentro do bar onde o casal se encontra todas as quintas-feiras. A atmosfera, no começo, é leve – sentimos a liberdade dos personagens para se recriarem como quisessem: onde nasceram, quem eram seus pais, que profissão seguiram, que viagem fizeram. Mas, quando nos encaminhamos para o fim, essa atmosfera ganha contornos de frustração e tristeza, por conta desse amor não realizado (esses foram os sentimentos que cresceram em mim como espectadora, não necessariamente entre os personagens). Para mim, é um filme triste, que me remeteu – guardadas as proporções – ao belíssimo “Amor à Flor da Pele” (2000). O roteiro é bem desenvolvido dentro de sua proposta, não percebi nenhuma contradição na história e o achei criativo. Tecnicamente é um filme convencional, sem grandes destaques, com exceção da trilha sonora incidental (que não pertence ao universo ficcional) que traz um piano com cara de fundo musical de bar chato demais. O elenco traz Eleonora Wexler como Irene – gostei bastante do trabalho dela, ela consegue dar espessura para uma personagem que não oferece assim tantos elementos para tal – e Luis Rubio como Yuri – embora ele esteja bem no personagem, tive a impressão de que o ator não o desenvolveu na mesma medida que a parceira de elenco. É um filme interessante, criativo, mas que me deixou certo amargor na boca. Não desgostei certamente, mas tenho alguma dificuldade em recomendá-lo. Assistido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
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