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hikafigueiredo

“Tiger Stripes”, de Amanda Nell Eu, 2023

Filme do dia (151/2023) – “Tiger Stripes”, de Amanda Nell Eu, 2023 – Malásia. Zaffan (Zafreen Zairizal) é uma menina de onze anos que tem sua primeira menstruação. Ela percebe as mudanças de seu corpo, enquanto é rejeitada pelas colegas por estar se diferenciando delas.





O argumento do filme – a menina que começa a sentir os efeitos da puberdade, percebe as mudanças em seu corpo e, assim, torna-se diferente das colegas da escola, motivo para bullying – é um ótimo ponto de partida. No entanto, a opção pelo uso de metáforas para discorrer sobre o assunto e, principalmente, a escolha pelos gêneros fantasia e terror, voltado, especificamente, para o body horror, não me pareceram as melhores alternativas. A menina Zaffan menstrua pela primeira vez e, como era de se esperar, seu corpo começa a sofrer modificações. Ocorre que, para acentuar o impacto destas mudanças corporais na vida da estudante, a diretoras Amanda Nell Eu optou por usar uma alegoria – ao invés das modificações habituais como o crescimento dos seios e o surgimento de pelos corporais, a menina começa a se transformar em uma criatura com inspiração nos tigres. Da mesma forma, as alterações de humor advindas da liberação dos hormônios, tão comuns na adolescência, transformam a garota em um animal selvagem. As colegas e a família percebem as modificações corporais de Zaffan, o que é motivo para rejeição e um preconceito claramente apoiado no sexismo (aqui lembrando que, no islamismo, religião professada na Malásia, a mulher que está menstruada é considerada impura, sendo, inclusive, impedida de fazer suas orações no templo, juntamente com suas páreas demais mulheres). Zaffan terá de lidar com essas alterações corporais, aceitá-las e, assim, transformar-se, no futuro, em uma mulher livre e completa. Então... descrevendo assim pode parecer que as mudanças metafóricas da protagonista tenham sido uma grande “sacada”... mas a realidade é que o filme é, no mínimo, esquisitíssimo. Talvez a maquiagem e os efeitos especiais muito precários tenham contribuído para que se estabelecesse uma relação não muito positiva com o filme... talvez o uso de algum humor – a participação de um exorcista charlatão aficionado em uso de redes sociais – tenha “quebrado” a seriedade da ressignificação corporal da personagem... certo é que eu não consegui me relacionar com a devida circunspecção com o tema e a obra e o resultado é que ela me arrancou risos e uma grande sensação de dúvida relacionada à interpretação daquilo que estava na tela. A leitura, aqui, não é muito espontânea, ela teve de ser quase forçada – uma interpretação a fórceps. E, como já comentado, a fragilidade técnica da obra, em especial no que se refere ao desenho de produção, maquiagem e efeitos visuais (mas que também se estende à fotografia e à edição de som) não me ajudaram a ver o filme com a necessária seriedade. Por outro lado, admiro o empenho do elenco jovem em assumir seus personagens fantásticos. Nesse sentido, é perceptível que a atriz mirim Zafreen Zairizal dedica-se à sua personagem Zaffan, trazendo humanidade para a protagonista – uma das melhores coisas do filme, para mim, é seu trabalho, que, se não é excepcional, é evidentemente esforçado; Também estiveram bem as atrizes Deena Ezral, como a invejosa Farah, e Piqa, como a empática Mariam. Confesso que gargalhei com a interpretação de Shaheizy Sam como o charlatanesco Dr. Rahim – a evidente veia cômica do ator, aliada à maneira como ele emulou os falsos “profetas” (me remeteu àqueles programas religiosos em que pastores evangélicos “exorcizam” pessoas tomadas por “demônios”, tudo mais falso que nota de três reais) foi a alegria do filme para mim. Enfim... é um filme que exige bastante do espectador, tanto de interpretação, quanto para levar a obra a sério. O filme foi agraciado com o Grande Prêmio da Semana da Crítica em Cannes (2023) – prêmio bastante controverso, na minha humilde opinião. Eu não o detestei porque o filme prendeu a minha atenção e me exigiu bastante trabalho intelectual para compreendê-lo, mas alerto que não é uma obra fácil e para qualquer público. Use o bom senso e só o assista se realmente estiver disposto a ver algo diferente e bem esquisito.

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