Filme do dia (96/2024) – “Toda Nudez Será Castigada”, de Arnaldo Jabor, 1972 – Geni (Darlene Glória), uma ex-prostituta, se suicida, mas, antes de morrer, grava uma mensagem para seu então marido Herculano (Paulo Porto), contando um pouco da história de ambos.
Baseado numa peça teatral de Nelson Rodrigues, o filme fez escândalo na época de seu lançamento – em plena ditadura militar, o filme foi proibido por ser considerado imoral, sendo liberado, com cortes e com classificação 18+, só após premiação em festivais internacionais. A narrativa acompanha a história de Geni e Herculano – ele, após o falecimento da primeira esposa, entrara em depressão e, bêbado, é levado a um prostíbulo por seu irmão, onde conhece Geni. Herculano se encanta por Geni, mas encontra resistência não apenas de sua família, mas de si próprio, face seus preconceitos e ditames morais. Como de costume, a obra de Nelson Rodrigues é uma crítica debochada e ácida à moralidade e hipocrisia da sociedade, em especial das famílias mais tradicionais e religiosas. Das tias carolas ao filho mimado e ditador, sobram críticas e provocações a todos os personagens – todos mostram algo que não são para a sociedade, enquanto escondem, a sete chaves, seus esqueletos no armário. Claro que Nelson Rodrigues, como de praxe, pesa a mão nas situações, mostrando as condutas mais extremas, considerando uma moralidade apoiada em regras religiosas e preconceitos de todas as espécies e frágil feito cristal. Mais lógica, ainda, foi a censura imposta ao filme, uma vez que a sociedade hipócrita e dissimulada não costuma gostar de ter suas podres entranhas escancaradas. Formalmente, o filme sofre de alguns maneirismos e questões técnicas da época, já que, no Brasil, vivíamos certa obsolescência quanto equipamentos e técnicas. A fotografia é “chapada”, isto é, a iluminação não realça detalhes ou texturas, tudo é muito uniforme e claro. O som da obra não poderia ser pior, a ponto de ter visto o filme com legenda pelo risco de não entender palavras ou frases tamanha a má qualidade da captação do som direto. Mesmo o desenho de produção me pareceu improvisado e muitos objetos de cena pareciam deslocados ou artificiais (como os quadros em excesso e destoantes entre si no casarão de Herculano). O texto de Nelson Rodrigues – ótimo, como sempre – não teve a melhor adaptação para cinema, na minha opinião: há vários momentos em que os diálogos continuam soando teatrais, considerando sua origem (certamente funcionam na peça, nem tanto no filme). Por fim, as interpretações, até mesmo pelo texto, aparentam certa artificialidade decorrente do tom teatral imposto. Ainda assim, Paulo Porto sai-se bem como Herculano – ele impõe, ao personagem, uma falsa rigidez moral que basta um pouco de álcool ou sexo para cair por terra; gostei do trabalho do estreante Paulo Sacks como Serginho – o rapazote mostra-se um sobrinho-neto mimado e filho cruel e ditador que esconde sua real natureza de todos; Paulo César Pereio interpreta o irmão Patricio, e, bem, não precisou fazer muita força para dar vida ao personagem cafajeste rs; por fim, Darlene Glória interpreta a prostituta Geni e confesso que fiquei impressionada com o magnetismo e sedução impostos à personagem – Darlene Glória era fantástica! O filme foi contemplado com o Urso de Prata do Festival de Berlim (1973). Eu gostei e recomendo, principalmente porque sou fã incondicional das obras de Nelson Rodrigues – adoro o deboche dele e as histórias feitas para chocar os puritanos! O filme completo pode ser encontrado no Youtube.
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